sábado, 3 de abril de 2021

Como a pólvora já existia, podemos acender esse pavio desde 1500

 


Chegando aqui se depararam com os donos da casa. Lindos, cor de melado, adornados com o que a natureza dava, livres e com suas organizações sociais e religiosas em perfeita harmonia com o ambiente. Não diferente dos brancos guerreavam, mas com princípios e intenções bem distintas. 
Rezavam e tinham suas crenças como os brancos. Explicavam o nascer do sol, a existência das estrelas e o barulho do trovão através de mitos com muita riqueza, beleza e arte. Por isso, talvez também tenham sido tão ridicularizados, já que Narciso acha feio o que não é espelho, e a inveja por tanta poesia tenha colocado mais lenha na fogueira.
Na primeira carta, dizia – “são inocentes, bons e de bela simplicidade”, isso nas palavras do tal de Pero. No entanto, na busca de motivos legitimadores para o poder e a dominação, nas terras Brasilis os nativos viraram bárbaros ferozes comedores de homens. Assim também evitavam que outras nações navegantes viessem descobrir o paraíso. Não adiantou muito não, uns franceses vieram e não é que fizeram amizade...


AH ESSES SELVAGENS


Um meio de divulgar eram as ilustrações que circulavam na Europa e imagens de canibalismo para representar os nativos Brasilis era a fofoca da corte.
Em 1505, um alemão quis desenhar e escrever em texto esse povo tão ofensivo – “ Pessoas que andam nuas, com uma cor de pele avermelhada, não são possuidores de nada, porque a propriedade é de todos e não possuem governos”

AH ESSES SELVAGENS

Isso foi em 1500! Muita coisa mudou, o homem branco aprendeu a respeitar as diferenças. Será? 
Na ditadura militar, desde o plano de integração nacional em 1964 até 1985 foram massacrados 8350 indígenas, segundo a Comissão da Verdade. Detalhes como roubos de terras, prisões, torturas, espancamentos, envenenamentos, brinquedos doados para crianças contaminados com vírus de sarampo e varíola e estupros fazem parte dos relatos. 
Em 1969, foi criado um reformatório. Com o pretexto de que o governo estava preocupado com a situação dos indígenas e daria apoio e assistência, o governo criou um local de punição, repressão e controle dos nativos que estavam resistindo ao avanço latifundiário. Os indígenas eram proibidos de falar sua língua, havia solitárias, equipamentos de torturas e relatos de afogamentos, pauladas e enforcamentos. Esse reformatório fechou em 1971, porém os “prisioneiros” foram levados a outro local para trabalhos forçados como prisão rural regulada pela ditadura.

AH ESSES SELVAGENS

Esse pavio é detonado até hoje. Assistidos de forma precária pelo governo atual, as crescentes invasões, os garimpos ilegais em seus territórios, as comunidades indígenas enfrentam, quase que sozinhas, o avanço da PANDEMIA do corona vírus.
Na briga há muitos guerreiros com a pele avermelhada e tinta no rosto, mas também os sem pintura, com roupas, os diplomados, os com cocar... todos se juntam em frentes de defesa dos Povos Indígenas para lutar. E a luta não acaba nunca. Talvez depois que todos morrerem...

AH ESSES SELVAGENS

O MINISTRO QUE (NÃO) SABIA JAVANÊS

 


Publicado na Gazeta da Tarde em 1911, O homem que sabia javanês apresenta um pouco do oportunismo baseado no improviso, traço marcante do conhecido ‘jeitinho brasileiro’ desde sempre. De autoria de Lima Barreto, o conto descreve a aventura de Castelo, personagem fictício descrito de forma caricatural, que se tornou professor de javanês sem ter conhecimento algum do idioma. A obra abre uma discussão sobre ética e questiona a legitimidade de carreiras construídas a partir de bases pouco sólidas, algo que já havia descrito em obras como na sátira Os bruzundangas, em que relata as mazelas de uma república cuja organização política e estrutura social eram bem próximos do que o Brasil experimentava no começo do século 20.
“Eu tinha chegado havia pouco ao Rio e estava literalmente na miséria. Vivia fugido de casa de pensão em casa de pensão, sem saber onde e como ganhar dinheiro, quando li no Jornal do Commercio o anúncio […] Ora, disse cá comigo, está ali uma colocação que não terá muitos concorrentes[…] Saí do café e andei pelas ruas, sempre a imaginar-me professor de javanês, ganhando dinheiro e andando de bonde, sem encontros desagradáveis com os “cadáveres””, explica Castelo ao amigo Castro logo no início da obra.
O termo cadáver pode se referir a uma alusão aos encarregados dos aluguéis dos quartos de pensão. No Brasil pós-covid 19, os cadáveres, no entanto, são reais. Segundo a Organização Mundial da Saúde, o número de mortos ultrapassa 277 mil e o número de casos notificados ultrapassa a marca de 10 milhões.
Antes de descrever todos os pormenores de sua saga como professor de javanês, Castelo revela que, em outra ocasião trabalhara como adivinho, e chegara a omitir que era bacharel para obter maior confiança entre os clientes que o procuravam. Segundo ele, tudo isso são “partidas que havia pregado às convicções e às respeitabilidades para poder viver”. Quando o general-de-divisão Eduardo Pazuello, atual ministro da Saúde, assumiu o posto substituindo Nelson Teich, 15 mil pessoas já haviam perdido a vida para o novo coronavírus. Na ocasião, ele admitiu ter conhecimento de leigo na saúde, conforme entrevista ao site da revista Veja, em 21 de abril de 2020, e defendia um cuidado maior do governo federal para com os dados da pandemia:
“O meu grau de conhecimento específico, técnico, de médico, é leigo. A gente observa que dados precisam ser melhorados, a gente precisa ter números mais fidedignos, com menos risco de manipulação, para que se definam as estratégias em cima de dados reais. Se você não tiver certeza absoluta dos dados, tudo o que você planejar não tem resultado”, disse ele.
Como é de conhecimento público, o número de mortes subiu de maneira alarmante e a falta de conhecimento na área de saúde pode ter, de certa forma, agravado o problema. No auge da pandemia, no início da segunda metade do mandato do capitão Jair Bolsonaro, e a quatro meses de completar um ano à frente da pasta, Pazuello protagonizou um boicote à vacina, participando de pelo menos uma live em redes sociais com o mandatário, endossando impropérios quanto à eficácia da imunização. Assim como o presidente, o ministro também defende o uso de medicamentos como a cloroquina e ivermectina para evitar o agravamento de pessoas contagiadas pelo coronavírus, na contramão do que é preconizado pela Organização Mundial da Saúde.

A falta de conhecimento técnico e artimanhas também caminham juntos em O homem que sabia javanês. Em uma sociedade guiada por valores positivistas e resquícios da monarquia, o autor usa de ironia para denunciar a falta de organização política, muitas vezes orquestrada por pessoas que destilavam sua influência por meio de um saber artificial. No caso de Castelo, a pretensa carreira de professor de javanês rendeu uma indicação para trabalhar no Ministério das Relações Exteriores. Com seu jeito aberto e sem qualquer escrúpulo em mentir, passa a desenvolver boa relação com o aluno, um barão já idoso que o havia contratado para traduzir uma obra escrita neste idioma, deixada como herança pelo avô e de grande valor afetivo.
“Fui perdendo os remorsos; mas, em todo caso, sempre tive medo que me aparecesse pela frente alguém que soubesse o tal patuá malaio. E esse meu temor foi grande, quando o doce barão me mandou com uma carta ao visconde de Caruru, para que me fizesse entrar na diplomacia. Fiz-lhe todas as objeções: a minha fealdade, a falta de elegância, o meu aspecto tagalo. “Qual!” retrucava ele. “Vá, menino; você sabe javanês!”. Fui. Mandou-me o visconde para a Secretaria dos Estrangeiros com diversas recomendações. Foi um sucesso”.
Quanto ao ministro do capitão, a experiência e conhecimento em logística obtido em anos no Exército — segundo reportagem do site Congresso em Foco, Pazuello não possui especialização acadêmica na área — pouco tem valido para amenizar o caos social imposto pela pandemia do novo coronavírus. Com a pandemia se agravando na região Norte, visitou Manaus para recomendar e disseminar o uso da cloroquina para conter a doença. Dias depois, a capital amazonense, cujo sistema de saúde já havia enfrentado sérios problemas em abril de 2020, no início da pandemia, viveu nova tragédia com o fim do estoque de oxigênio nos hospitais e a morte de pacientes por asfixia, o que rendeu a abertura de uma investigação pela Procuradoria Geral da República. O objetivo é apurar a conduta do ministro em relação a possíveis medidas que poderiam ter sido tomadas para evitar a falta de oxigênio e o colapso nos hospitais. Em conversas reservadas, ministros do Superior Tribunal Federal (STF) defendem sua responsabilização criminal.
Fato é que Pazuello admitiu que soube da possibilidade de falta de oxigênio pelo menos uma semana antes do dia mais grave de mortes por asfixia em leitos de hospitais de Manaus. Segundo a Advocacia-Geral da União (AGU), o governo federal sabia do “iminente colapso do sistema de saúde” do Amazonas por conta da Covid-19 dez dias antes de a crise estourar e que foram realizadas reuniões com autoridades locais quando o Ministério da Saúde detectou que o sistema de saúde do Amazonas estava à beira do colapso. Pazuello afirmou que a velocidade de internações aumentou muito e que “o consumo triplicou, quadriplicou, quintuplicou”, e a empresa White Martins, responsável pelo suprimento, não deu conta da demanda necessária. A multinacional brasileira, no entanto, alega que havia feito um alerta sobre o aumento abrupto no consumo de oxigênio, que saltou de 30 mil metros cúbicos para 76,5 mil metros cúbicos em pouco mais de 15 dias.
Dias antes da da grave crise em Manaus, o ministro da saúde já havia protagonizado um ato falho, quando disse em entrevista que um avião iria até a Índia para trazer 2 milhões de doses de vacina, fato colocado como um grande equívoco pela imprensa do país asiático, o que só ocorreria dias depois. Sem contar nas idas e vindas para o início da campanha de vacinação em todo o País, em demonstração clara de golpes de improviso motivados por decisões do governador de São Paulo, João Doria, desafeto declarado do presidente Bolsonaro, que havia criado um fato político ainda no fim de 2020, ao declarar que a vacinação em seu estado teria início em 25 de janeiro.
Voltando à obra de Lima Barreto, passado o nervosismo inicial como diplomata, bastou a Castelo manter a tranquilidade e seguir emulando seu personagem. Ganhou notoriedade entre os círculos sociais mais altos, assinando colunas em jornais e representando o Brasil no exterior, sempre acompanhado do seu vultuoso aposto. Participação em congressos, jantares, cargos de destaque e bom salário no corpo diplomático. No fim das contas, teria valido a pena tamanha sordidez? Protagonista e interlocutor não têm dúvida que sim. Por fim, o amigo Castro solta um afago, e expressa toda sua “admiração” pela coragem do amigo, que responde: “Olha, se não fosse estar contente, sabe o que ia ser? Quê? Bacteriologista eminente”.
Diferentemente do personagem imortalizado pelo cronista de Todos os Santos, Pazuello tem escorregado na retórica. No caso do colapso em Manaus, veio a público desmentir declarações dadas por ele mesmo dias antes, em que deixava claro a necessidade de priorizar o tratamento precoce contra a covid-19, ao contrário do que recomenda a Organização Mundial da Saúde. Apesar de todos os problemas provocados pela notória falta de gestão e a possibilidade de responder criminalmente pelas mortes ocorridas durante a pandemia do novo coronavírus, antes do fim de semana em que pipocaram notícias sobre sua saída devido a um problema de saúde, não havia indício de que o ministro seria substituído no curto prazo. A interlocutores, o presidente não escondia sua satisfação pela gestão de Pazuello.








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